terça-feira, 18 de março de 2014

Jogo de Damas

Ontem foi um dia cheio!
Fui ao Jogo de Damas. Isso é um evento voltado à mulheres que têm um negócio próprio.
Foi bastante inspirador ouvir os seus relatos, as suas experiências. É sempre muito bom saber que não sou só eu que enfrento as desconfianças de pessoas que não acreditam que uma mulher pode liderar uma equipe e ser dona do próprio nariz.



Sei bem do que estou falando: sou uma arquiteta que coordena obras, um lugar genuinamente masculino, cuja equipe é composta de homens que estão acostumados a mandar nas suas mulheres.

Certa vez, há algum tempo, levei um empreiteiro até um terreno para conversar sobre a obra, etc. Ele não pode resistir e me disse que estava se sentindo desconfortável pelo simples fato de estar na carona e uma mulher estar dirigindo. Fato: eu sou uma motorista muito boa. Não era esse o caso, ele só estava estranhando a inversão dos papéis. Rimos! Rimos porque era uma boa pessoa que estava dividindo um sentimento. Mas nem sempre é engraçado!

Bom, voltando ao empreendedorismo, eu agora, divido a minha estória:

2005 - Me formei no dia 22 de julho. Totalmente quebrada. Não tinha um centavo no bolso, muito menos um carro. Precisava de um emprego qualquer que fosse, urgente!
Em setembro, fui trabalhar na madeireira Vacariense. O anúncio do jornal dizia "Arquiteta". Bom, na verdade, era para vendedora de casas de madeira e alvenaria, com um salário fixo e comissão. Além disso, era preciso também fazer a aprovação dos projetos na prefeitura. A empresa definia o valor dos honorários: o cliente pagava metade do valor cobrado no mercado, além disso, a empresa ficava com metade do valor cobrado do cliente. Ou seja, eu recebia 1/4 (um quarto) do valor de mercado para projetos arquitetônicos, que por sua vez, já cobrava um valor baixíssimo. Além disso, eu precisava assessorar os vendedores na hora de montar as plantas baixa, de graça, é claro. Ainda mais: eu era a arquiteta responsável pela empresa perante o CREA. Isso me preocupava muito, já que a empresa mantinha pelo menos 30 obras ao mesmo tempo, em todo o Rio Grande do Sul. Como eu poderia acompanhar 30 obras ao mesmo tempo? É humanamente, fisicamente, cientificamente impossível. Então, as obras andavam sozinhas. Não só a Vacariense trabalhava assim, todas as empresas de casas pré-fabricadas: Pampa, Arte Casas, Casa das Casas, Safari, etc.

2006
Pedi demissão. Então a chefe me propôs que eu instalasse um escritório ao lado da loja de vendas, na RS 020 e continuasse atendendo a empresa nas aprovações dos projetos nas prefeituras de toda a região metropolitana de Porto Alegre. Aceitei, mas pagando "apenas" 20% dos honorários de projeto. Isso em troca da posse de uma casa de madeira antiga, que eu usaria como escritório. Montei um escritório bem simples, só o suficiente para ter um espaço para instalar um computador. Poucos meses depois, descobri um tumor na mama, que poderia ser maligno, fui hospitalizada para fazer uma cirurgia e fiquei um tempo morando na casa de mamãe para me recuperar da cirurgia (essa foi a parte boa disso tudo). Pois não é que uma das equipes de obra da empresa utilizou do meu escritório como barraco de obra? Sim, depositaram material de obra, usaram como cozinha, roubaram uma estante, fizeram e aconteceram. menos mal que eu tinha tirado o computador de lá. Não sendo isso o suficiente, um despachante que prestava serviço à Vacariense se apossou da casa e arrancou a minha placa da fachada. Perdi as estribeiras. Não podia mais ser tratada desta maneira.

2007-
Resolvi que era hora de ter o meu próprio negócio. Então surgiu uma obra para fazer. Ao mesmo tempo, os sócios da Construtora Gaúcha se desentenderam e resolveram vender a empresa. Foi quando eu abandonei de vez a Vacariense, dei um basta. Estudei a possibilidade de assumir a Gaúcha e dar andamento na empresa. Foi quase! Seria a maior burrada de todos os tempos. A empresa estava com problemas financeiros graves, muitas dívidas com fornecedores, havia obras não entregues (e os sócios já tinham recebido os pagamentos), havia obras que faltava habite-se para receber o pagamento advindo de financiamento, o aluguel do depósito estava irregular... Virgem Maria! Meus pais tiveram um papel fundamental: me impediram de fazer essa coisa terrível! Resolvemos (eu e meu pai) então, criar uma empresa nova, a Vivenda, alugar um terreno na RS 020, construir um show room, para vender obras residenciais de madeira e alvenaria. Mas essas decisões foram todas de supetão, nada disso foi pensado ou planejado, tudo isso foi na base do "já estou fazendo". Na época eu nem sabia que existia Plano de Negócios, Pesquisa de Mercado, e outras ferramentas. Então, tinha um vendedor da Vacariense, o Rogério, que me pediu para entrar de sócio comigo. Ele era um bom vendedor, achei que seria uma boa parceria. E ele queria o seu amigo Eliseu na sociedade também. Eita! Acabei aceitando. Fizemos um grande esforço para implementar a empresa! Até o meu carrinho - um Cuore - entrou na dança: o vendi por R$ 6mil para um pastor. Este senhor era uma figura muito engraçada, sempre vestido com o mesmo terno cor de vinho, e me pagou em dinheiro - todas as notas eram de R$ 5,00 e R$ 1,00! O resultado foi este:

Bonito, né? Fui eu que projetei e executei. Posso provar. Sabe o que aconteceu? TODOS os concorrentes venderam casas iguais a esta. Vários arquitetos assinaram projetos iguais a este. Vários. Eu me fiz passar por cliente e visitei uma arquiteta. Perguntei se ela tinha feito o projeto original. E disse SIM! Pasme.

2008
Fechamos algumas poucas obras, até que, logo depois de terminar a construção do show room, descobri que os 2 sócios, cuja função era a de fazer a parte comercial da empresa, haviam vendido diversas obras. Entretanto, eles estavam desviando a maioria delas: eles contratavam empreiteiros para fazer as obras e ficavam com os lucros. Deu polícia e tudo mais. Mas não tive muito o que fazer, fui informada que eles poderiam fazer isto, já que eram sócios. E o stress foi tanto que eu só queria distância daquela gente. Graças a Deus, apareceu o sr. Floriano e comprou a nossa parte na sociedade. Ouvi dizer que ele se arrependeu muito. Mas nunca mais falei com ele, já que ele pensou que eu e o pai éramos os vilões. Rogério tinha o dom de convencer as pessoas dos maiores absurdos. Fim desta etapa. O que fazer agora? Um grande sonho foi por água abaixo, todas as expectativas, os ideais.


Decidimos abrir outra empresa, desta vez com a idéia de construir para vender casas prontas, com financiamento. Foi o que fizemos. E estamos bem. Ficamos ricos? Nem perto disso. Se engana redondamente que pensa que construção gera rios de dinheiro. Quem ganha muito dinheiro é o malandro que vende qualidade e entrega qualquer coisa.

O importante é que deixei para trás todas aquelas pessoas que me fizeram mal, que se aproximaram só para tirar algum tipo de proveito, tudo ficou para trás, não quero nem notícias. Hoje, só olho para frente, sempre perseguindo um novo sonho, cada dia maior e mais bonito. E meus pais, sempre me apoiando! Meus amores!